A morte do Papa Francisco: um brevíssimo comentário teológico e pastoral.
Reflexões concretas em meio à tristeza.
1.
Na manhã do dia 21 de abril, por volta de 6:15, a minha esposa me acordou abruptamente, dizendo-me que o Santo Padre havia falecido.
Não quis acreditar, afinal ele acabara de aparecer aos fiéis em Roma no domingo de Páscoa.
Levantei-me num sobressalto, busquei rapidamente conferir a informação e era realmente esse o caso.
Gostaria de oferecer um brevíssimo comentário teológico, por se tratar de algo relativo à Palavra de Deus, e pastoral, por se tratar de uma sugestão sobre a ação concreta do cristão.
2.
Ambos os comentários são destinados a leitores católicos.
Isto me permite ser mais direto ao ponto.
Entretanto, caso você não seja católico, mas se interesse por esse tema, será uma alegria tê-lo aqui.
Contudo, não farei teologia positiva. Reforço que vou direto ao ponto.
Caso você queira provas positivas do dogma, com exegese da Escritura, com interpretação de documentos dos Pais da Igreja e de outras fontes escritas da Tradição etc., basta que se vejam bons livros de teologia sistemática/dogmática católica.
Recomendo como bibliografia, nesse sentido, o primeiro volume do Handbook of Catholic Dogmatics, do Matthias Scheeben, e do Dogmatic Theology, do Joseph Pohle.
Este artigo breve será fundado em obras como essas, mas sobretudo no Scheeben.
3.
Eis o lado teológico.
Inúmeros assuntos estão sob o tema do papado.
Um deles, que talvez não seja tão claro na mente dos cristãos católicos, trata da relação entre o Papa e a proclamação da Palavra de Deus.
Este será, portanto, o assunto específico que irei focar brevemente. Vejamos abaixo.
4.
Em muitas passagens do Novo Testamento constatamos que Cristo designou um organismo de apostolado para proclamar a Palavra de Deus.
Ele envia, neste caso, determinados homens que o representam, seus embaixadores, para proclamar publicamente essa Palavra.
A eles ainda concede não somente a comissão de proclamar, mas também:
A) A autoridade, de modo que a fé possa ser gerada pelo Espírito mediante a proclamação, como São Paulo diz em Rm 10.
De fato, para um estímulo à fé bastaria a comissão de proclamar a Palavra. Entretanto, para gerá-la requer-se ainda que aqueles que foram enviados tenham a autoridade da credibilidade.
B) O poder exigir o reconhecimento da verdade que pregam, sustentando-a com penas. Pode-se lembrar aqui de dizeres como: quem não crer será condenado; quem vos despreza a mim despreza; o anátema de Gl 1:8 etc.
A fé, como se sabe, é a resposta ao Deus que se revela.
Há uma só revelação de um só Senhor, proclamada mediante um só organismo de apostolado, e que se aceita devidamente por uma só fé e um só batismo, o qual é um todo unitivo com a fé (Gl 3:26s).
E para ser gerada uma fé única, obediente (Rm 1:5) e universal, foi concedido ao organismo de apostolado, em conjunto com a comissão e a autoridade da credibilidade, o poder de exigir o assentimento àquilo que é proclamado.
Deus, nesse sentido, exerce o seu poder através desses que Cristo enviou, que agem em seu nome, que o representam.
Ele age quando esses que foram enviados instruem, dão testemunho da verdade, estabelecem uma regra de fé, administram os sacramentos etc. Diga-se o mesmo daqueles que foram enviados pelos apóstolos, como estes foram por Cristo, e Cristo por Deus.
Acontece, contudo, que dentre esses que agem em nome de Jesus e o representam, um deles foi estabelecido como representante preeminente sob o qual devem estar sujeitas todas as ovelhas de Cristo (Jo 21:15ss), dando ao organismo de apostolado um centro firme e uma organização visível permanente.
Recai então particularmente sobre esse representante preeminente, que apascenta todas as ovelhas de Cristo, a legitimação externa dos demais agentes da proclamação autêntica da Palavra de Deus.
Isto confere um caráter de proclamação universal, autêntica, válida e com autoridade dessa Palavra, cuja resposta devida é aquela fé única, uniforme, obediente e universal.
5.
Esse representante preeminente após São Pedro é o seu sucessor. Até 21 de abril de 2025, ele era o Papa Francisco.
Talvez essa breve reflexão auxilie o cristão católico a compreender um ponto importante:
O organismo de apostolado da Igreja, como brevemente indicado acima, reivindica a proclamação autêntica, oficial e com autoridade da Palavra de Deus.
Deus, contudo, falando de um ponto de vista prático, não permitiria a manutenção desse apostolado por dois mil anos, com o assentimento de tantas pessoas piedosas e santas, cito apenas duas, São Francisco de Assis e São Lourenço de Brindisi, se essa reivindicação fosse falsa.
Pelo contrário, o organismo de apostolado já teria deixado de existir; ele não teria tido tanto êxito, por tanto tempo e universalmente, em gerar bens espirituais abundantes.
(Veja-se teologia positiva nos livros mencionados previamente.)
Isto traz consigo a reflexão pastoral abaixo.
6.
Já pululam, creia-me, apostas de quem será o novo Papa.
Já há discussões políticas sobre o próximo conclave.
Já há quem queira saber se o Papa Francisco foi para o céu ou o purgatório.
Já há deboches sobre a morte do Papa. Quanto a estes, oremos pela conversão de quem os faz.
Sugiro que tenhamos, contudo, nós, cristãos católicos, em mente o que foi dito acima.
Em outros termos: o papado, centro firme desse organismo de apostolado, é algo instituído por Cristo, cuja garantia de manutenção e certeza de proclamação se fundam na promessa dele.
Procuremos aderir incondicionalmente às verdades da nossa fé, que é única, uniforme, obediente e universal, e assim repousaremos a mente e o coração, elevando-nos em oração neste momento histórico para a Igreja.
E a oração nos fará aderir à Palavra de Deus, e nos concederá o que Ele, em sua bondade, houver decretado para o nosso bem.
Dentre esses santos decretos, temos esperança de que um haverá de ser um Papa conforme o seu coração.
O que mais vimos na semana passada foram especialistas.
Amo a maneira como os jornalistas falam quando anunciam esses especialistas.
Tem especialista pra tudo.
Sobre papado, então, muitos mesmos.
Mas todos demonstram, quer do ponto de vista político quando do ponto de vista teológico uma única certeza: mesmo a seus detratores, a Santa Igreja Católica produz um efeito relevante r decisivo na história humana, desde que Cristo ressuscitou!
Aleluia!
Muito bom! Escrevi - de uma perspectiva muito mais "rasteira" - uma breve reflexão por ocasião do passamento do Santo Padre. Seu texto me provocou muitas reflexões e me deu caminhos para aprofundar a meditação.